O espetáculo do beletrismo
Pouca ação, muita falação - mas com belas imagens. Assim foi o espetáculo “Salomé: um sonho de Oscar Wilde”, dirigido por Edson Bueno
O diretor Edson Bueno é daqueles que usam e abusam da literatura em suas montagens, tendo feito dezenas de peças derivadas de adaptações literárias. Algumas das mais recentes foram “Projeto Poe: o Corvo” (2006), baseado no poema “O Corvo” e outros textos de Allan Poe, e a ótima “Capitu, Memória Editada” (2005), baseada no “Dom Casmurro” de Machado de Assis.
Porém, ao contrário de outros diretores, como Marcelo Marchioro (e vocês devem lembrar de seu “Pico na Veia”, baseado no livro homônimo de Dalton Trevisan), ou Moacir Chaves (com “Memória”, baseado em “Memórias Póstumas de Brás Cubas”), Edson costuma fazer adaptações criativas, ousadas, que vão além do mero recitar o texto do livro. Para isso, após uma longa pesquisa, o diretor enxerta novos personagens, inventa fatos novos, enfim, faz o que for preciso para que a idéia primordial de um escritor consiga sobreviver no palco.
Toda essa pesquisa e criatividade foram utilizadas mais uma vez em sua última peça, “Salomé: um sonho de Oscar Wilde” (que ficou em cartaz até o dia 8 de fevereiro no Espaço Cultural Falec) para criar uma dramaturgia nova, baseada em textos e aforismos de Oscar Wilde, e também na biografia desse escritor irlandês.
A partir disso, Bueno construiu uma montagem que faz um recorte do período em que Wilde concebeu a peça “Salomé” (que é de 1892) e os contratempos que ele teve que enfrentar na tentativa de encená-la na Inglaterra, tendo a atriz Sarah Bernhardt como protagonista.
Sendo assim, “Salomé: um sonho de Oscar Wilde” revelou-se uma peça bastante intelectual, nessa livre tentativa de reconstrução biográfica, inclusive fazendo referências verossímeis a outros escritores (Henry James, Mallarmé, Ibsen) da época.
A questão é que a peça fundamentalmente ficou relegada a esse beletrismo. Um dos principais sustentáculos da montagem foram os aforismos de Wilde (interpretado por Áldice Lopes), disparados a torto e a direito, e que por não estarem relacionados com ações muito importantes, acabaram não atingindo o público com a devida força. Sem falar de que faltou mais carisma para Áldice, que não encantou, não convenceu como o grande escritor. E se era para ser verossímil, quedê-lhe as longas madeixas? O ar molengão que vemos nos retratos de Wilde? Áldice estava mais para Clodovil.
Outro fator que enfraqueceu a peça foi que o período da vida de Wilde que foi encenado não possuía acontecimentos significativos, que realmente despertassem a atenção da platéia. Wilde sonhando, escrevendo, conversando com o seu produtor (Édson Bueno), indo ao teatro, ou o fato de “Salomé” não ter sido encenada, ou de Wilde não ter conquistado o tal Pierre Zizou (Marcel Gritten), há de se convir, não é nada comparado ao que Wilde sofreu nos derradeiros anos de sua vida, por exemplo.
Com relação à comédia, que é o gênero da peça, também ela não foi das mais engraçadas. O humor ficou mais por conta das histrionices de Pagu Leal, que fez o papel da atriz secundária que inveja Sarah Bernhardt (Laura Haddad), do que de qualquer outra coisa. E fazer piadas em cima da burrice da atriz de segunda categoria está longe de ser um recurso cômico original ou inteligente.
Por tudo isso, o que mais se destacou positivamente na peça foi o seu apuro estético. A montagem foi bonita, a iluminação de Beto Bruel, os cenários de Fernando Marés... Tudo muito faustoso, a começar pelo programa da peça, em papel couché, um pôster, praticamente, coisa meio rara de se encontrar em nossas produções locais. Também não se pode deixar de mencionar os momentos de grande lirismo em "Salomé...": a figura de Narciso banhando-se, a dança final do Mancebo-Salomé, ou a leitura do conto “O Rouxinol e a Rosa”.
O grande frasista, Oscar Fingal O' Flahertie Wills Wilde (1854 - 1900)
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