24 de mar. de 2010

Teatro)))
Ariane Mnouchkine, no Vila
Inédito no Brasil, novo documentário sobre Ariane Mnouchkine e seu Théâtre du Soleil estreou na terça-feira, em Salvador, no Teatro Vila Velha


Ariane Mnouchkine l'aventure du Théâtre du Soleil (2009)

Ariane Mnouchkine passando um sabão num ator cambojano que se recusa a aprender a ler... Ariane mandando atores afegãos vestirem burcas para experimentar como é bom ser uma mulher no Afeganistão... Ariane a revelar, na China, que suas forças podem acabar, mas que o Théâtre du Soleil continua mesmo sem ela...

Cenas como essas, retratando uma das mais importantes encenadoras do teatro contemporâneo, hoje com 71 anos, foram vistas na terça-feira (23) no Teatro Vila Velha. Inédito no Brasil, o documentário Ariane Mnouchkine l'aventure du Théâtre du Soleil (2009), dirigido por Catherine Vilpoux, estreou em Salvador para um público de aproximadamente 30 pessoas.

Apesar de não ser um documentário muito aprofundado, em 75 minutos ele apresenta um bom panorama sobre a trajetória de Ariane e sua companhia. E quem esteve presente no Cabaré Café pôde conhecer ainda um pouco mais sobre o universo do lendário grupo francês em um bate-papo com a jornalista, pesquisadora e produtora teatral Deolinda Vilhena.

Estudando o Théâtre du Soleil há uma década, Deolinda tinha histórias de sobra para contar. Ainda mais que conviveu com a trupe de Ariane por cinco anos, em Paris, para apresentar, em 2007, uma tese de doutorado na Sorbonne sobre os modos de produção do Soleil.

Importância
“O teatro francês pode ser dividido em antes e depois de 1789 [peça sobre a Revolução Francesa, apresentada em 1970]”. Com essa afirmação sobre um dos mais celebrados espetáculos do Théâtre du Soleil, Deolinda não esconde a sua paixão pelo grupo. “É nesse tipo de teatro que eu acredito.” Independente de as pessoas gostarem ou não dos espetáculos dirigidos por Ariane – como uma senhora na platéia, que disse não achar nada demais neles –, Deolinda afirma que o posicionamento ético da diretora é exemplar. “Pode-se discutir uma porção de escolhas que ela faz, mas é fato: há 46 anos Ariane se mantém fiel a seus ideais, mostrando que é possível fazer teatro de um outro jeito.”


E para quem também é fã de Ariane, Deolinda traz boas notícias. De acordo com ela, há uma grande chance de o Théâtre du Soleil vir ao Brasil em 2011, com o novo espetáculo Les Naufragés du Fol Espoir. Seria a segunda visita ao país, depois da apresentação de Les Éphémèrs em São Paulo e Porto Alegre, em 2007.

Algumas curiosidades sobre o Théâtre du Soleil

Controle total
Segundo Deolinda Vilhena, Ariane Mnouchkine supervisiona absolutamente tudo na Cartoucherie de Vincennes, sede do Théâtre du Soleil, em Paris. "Ela recebe o público na entrada do teatro, certifica-se de que a comida servida antes da peça está boa e, se algo sair errado, seja na apresentação ou na recepção das pessoas, ela faz questão de devolver o dinheiro dos espectadores na mesma hora."

Turnês
O Théâtre du Soleil só deixa Paris se conseguir levar toda a estrutura da Cartoucherie de Vincennes para outros países. Das arquibancadas à louça usada pela trupe, ou vai tudo com eles, ou nada feito.

Admissão
Para se candidatar a uma vaga no Théâtre du Soleil, o primeiro passo é escrever uma carta, apresentando um bom motivo para fazer parte do grupo. Currículos ou indicações pouco importam. O que vale é o bom motivo. A partir disso, uma multidão de pessoas pré-selecionadas são convidadas a participar de um workshop que funciona como um processo seletivo. “De 800 pessoas que fazem o teste, só umas 10 ficam”, conta Deolinda. “Lá o critério de seleção é o mais subjetivo do mundo. Conquistar a simpatia do grupo é um dos critérios mais importantes para se entrar no Soleil.” Segundo Deolina, na torre de babel da Cartoucherie, os brasileiros representam uma grande fatia de uma equipe de cerca de 80 pessoas, perdendo em número apenas para os italianos.

Subvenção e grana curta
O Théâtre du Soleil não aceita nenhum patrocínio de empresas privadas. “Ariane lembra assim ao Estado que ele tem a obrigação de investir na cultura”, aponta Deolinda. Entretanto, o Soleil tem apenas 30% de seus custos bancados pelo governo – recebendo uma subvenção de um milhão de euros por ano. Setenta por cento dos custos restantes é pago com a bilheteria dos espetáculos. “Por isso o Soleil depende do sucesso. Se uma peça não dá certo, quem assume o prejuízo são os próprios integrantes do grupo. Eles chegam a ficar sem receber o salário pleno deles, e entram numa espécie de seguro desemprego. ” Deolinda explica que, desde a fundação do grupo em 1964, todo mundo no Théâtre du Soleil recebe o mesmo salário, que é apenas 30% maior do que o salário mínimo francês.

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